«Ensaio sobre o Dever (Ou a Manifestação da Vontade)», de Rute Simões Ribeiro, é o primeiro romance desta escritora portuguesa e foi uma das cinco obras Finalistas do Prémio LeYa 2015, com o título que recebeu originalmente, "Os Cegos e os Surdos".
Com uma escrita e um imaginário fundados em José Saramago e Alfred Hitchcock, este livro enquadra-se dificilmente num género literário, desvinculando-se de limites normativos que pudessem condicionar a narrativa. Refletindo, com grande subtileza, um dos períodos mais conturbados da história mundial, a autora desenvolve uma teia de personagens e de eventos insólitos, sociológicos e políticos, que o leitor consegue imaginar poder passar-se na atualidade, exibindo um profundo domínio sobre as palavras e um particular sentido de humor.

Sinopse:
Os cidadãos do mundo inteiro são chamados a tomar uma decisão por uma entidade desconhecida. Têm de escolher um sentido apenas, «a saber», pode ler-se na misteriosa mensagem, «visão, audição, olfacto, tacto, paladar, com exclusão do apelidado sexto sentido, dado que, neste último caso, é o sentido que escolhe o portador, em caso algum podendo ocorrer o inverso». Receando o impacto da escolha livre na organização da sociedade, o governo decide obrigar os cidadãos eleitores a escolherem o sentido determinado em conselho de ministros, sob pena de penalização no rendimento, chamando as pessoas, em nome da nação, ao exercício de um dever colectivo de reorganização após a «extracção dos sentidos». Perante a ordem do governo, os partidos da oposição apresentam moções de censura e os auto-apelidados «guerrilheiros da liberdade» formam «brigadas dos sentidos», ainda que acabando estas por «forçar as pessoas a serem livres». Três personagens principais entrecruzam-se na história, um primeiro-ministro, um guerrilheiro da liberdade e uma mãe, partilhando, de algum modo, sentimentos de dever e de vigilância constante. Após a instituição de novos hábitos, ajustados à nova «ordem de sentidos», o primeiro-ministro depara-se com um inusitado e perturbador pedido do país vizinho, em nome de um antigo acordo a que está vinculado.

Opinião:
Confesso que ao ler a sinopse desta obra, como diz que esta autora tem uma escrita e um imaginário fundados em José saramago, achei que ia ser um misto e talvez uma “cópia” das ideias de Saramago, de duas das suas obras. O “Ensaio sobre a Cegueira” já que se trata de cada um dos cidadãos escolher e viver apenas com um dos 5 sentidos e o “Ensaio sobre a Lucidez”, porque se fala na atitude do governo e dos políticos em geral. 
No decorrer da narrativa apercebi-me que apenas a conjugação destas duas ideias (talvez tenham sido a semente desta obra), faziam lembrar Saramago.

Ao longo desta leitura compreende-se perfeitamente porque foi um dos cinco finalistas do prémio Leya, não se compreende é porque nenhuma editora “agarrou” esta obra e a publicou.

Estamos perante uma narrativa muito diferente do usual, nada de vulgaridade na sua escrita, a autora brinca com as palavras sem medo, com um vocabulário super rico, e a cada página nos surpreende mais. Na verdade tudo é rico nesta obra, desde as personagens, às ideias colocadas ao longo da narrativa, assim como o desfecho.

Faz-nos pensar como seria se tivéssemos de passar por algo semelhante (isto sem dúvida que é algo idêntico a Saramago, o fazer-nos pensar e o interrogar-nos sobre tudo).
E se um dia cada um de nós tivesse de viver com apenas um dos sentidos? Será que nos conseguiríamos organizar e entreajudar sem que isso nos fosse exigido/imposto? Ou seria um “salve-se quem poder”, cada um por si e que sobreviva o mais forte?

Estou certa que esta autora tem muito para nos dar, e espero que no futuro nos presenteie, com muitas mais obras. Obras diferentes como esta, que não se vulgarize, só porque por vezes o vulgar vende mais.

Estive muito tempo a olhar para esta página, sem saber se deveria escrever o que costumo dizer sobre José Saramago, Afonso Cruz e Valter Hugo Mãe! Que o “gosto” pelas suas obras é de extremos, “ou se gosta mesmo muito ou se detesta”, e penso que com a Rute Simões Ribeiro é algo assim.


Eu gostei mesmo muito, quero ouvir falar muito sobre esta autora e já sei em que extremo estou. Quanto a vocês, têm de o descobrir, e para isso passem por aqui e aqui., não se vão arrepender.

5 comentários:

    Parece uma excelente obra!

     

    É sem dúvida :)

     

    Fiquei curioso, gosto de livros sobre os temas tratados

     

    Olá Eugen.

    É muito boa esta leitura, vale muito a pena. ;)

     

    "Sobreviver só com 1 sentido?... Salve-se quem puder?" Interessa-me, intriga-me, papel que vale a pena esfolhear

     

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