Sinopse:
O Deus das Pequenas Coisas é a história de três gerações de uma família da região de Kerala, no sul da Índia, que se dispersa por todo o mundo e se reencontra na sua terra natal.
Uma história feita de muitas histórias. A histórias dos gémeos Estha e Rahel, nascidos em 1962, por entre notícias de uma guerra perdida. A de sua mãe Ammu, que ama de noite o homem que os filhos amam de dia, e de Velutha, o intocável deus das pequenas coisas. A da avó Mammachi, a matriarca cujo corpo guarda cicatrizes da violência de Pappachi. A do tio Chacko, que anseia pela visita da ex-mulher inglesa, Margaret, e da filha de ambos, Sophie Mol. A da sua tia-avó mais nova, Baby Kochamma, resignada a adiar para a eternidade o seu amor terreno pelo Padre Mulligan..Estas são as pequenas histórias de uma família que vive numa época conturbada e de um país cuja essência parece eterna. Onde só as pequenas coisas são ditas e as grandes coisas permanecem por dizer.
O Deus das Pequenos Coisas é uma apaixonante saga familiar que, pelos seus rasgos de realismo mágico, levou a crítica a comparar Arundhati Roy com Salmon Rushdie e García Márquez.
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Esta foi uma leitura realizada no ambito da 3ª leitura conjunta do blogue Destante.
Coloco aqui o comentário que elaborei para o Destante e aviso que contem spoilers :)
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A minha opinião:
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Este é um livro cuja leitura não é fácil, porém quando entramos na história não conseguimos sair dela.A narrativa alterna entre o passado e o presente através das memórias de Rachel que volta à sua terra – Ayemenem - para se reencontrar com uma parte de si - o seu irmão gémeo (gémeos biovulares "Dizigóticos" chamavam-lhes os médicos")Arundhati Roy, nesta narrativa consegue demonstrar toda a sua tristeza e desalento para com o seu país. Toda a sua crítica não é feita de forma directa e "bruta", mas de forma subtil, na minha opinião esta subtileza traduz-se nas repetições de frases sobre os sentimentos que marcam e que ecoam no nosso pensamento, enaltecendo desta forma determinada realidade.
Através dos pensamentos e recordações de Rachel, visualizamos uma Índia Corrupta, suja, pobre e um tanto conformista onde a impotência dos pobres é grande tal como o regime que os lidera. A humilhação da mulher é denominador comum em toda a sociedade e não diferencia classes! "uma filha casada não tem lugar na casa paterna. Quanto a uma filha divorciada (...) não tem lugar em parte nenhuma"
Achei a escrita de Roy magnífica e cheia de informação nas entrelinhas.
Rachel chega a Ayemen num dia de chuva torrencial - a terra que chora pela sua filha que outrora se foi embora e que carregou consigo o coração pesado pela culpa da morte da prima e do “Deus das Pequenas Coisas”.A prima - Sophie Mol - chega de Londres para passar uma temporada com a família após morte do padrasto de quem gostava tanto ou mais que o pai. Ela é vista por Rachel como a "Amada desde o Princípio", esta ideia de Rachel é repetida do início ao fim da história, "Princípio" com letra maiúscula, amada desde o Princípio de todos os tempos, amada como um Deus, amada como Rachel e Estha nunca o foram (no pensamento de Rachel claro).
A chegada de Sophie, deixa Rachel insegura, deixa-a com "uma vespa a pairar no coração" vespa esta que consoante os sentimentos que os outros demonstram para com ela, abre as asas, esvoaça, arrepia-a... Rachel teme que Mol lhe tire a única coisa que ela tem - a sua família, a sua Ammu (sua mãe).No dia anterior à chegada da prima, esta família vai ao cinema ver "Música no Coração" e neste "episódio" da narrativa o contraste com o mundo dos gémeos é gritante. No filme, "Todos se amavam uns aos outros. Eram crianças limpas e brancas e as suas camas eram macias e com E-Dre-Dões" tudo é branco, limpo e feliz, enfim o mundo que não têm, que lhes é inacessível e com o qual só podem sonhar. Sophie Mol é comparada neste cenário por Rachel, ela por certo assemelha-se aos meninos do capitão Von Trap (limpa, branca, educada).
No cinema, algo de terrível acontece a Estha. Este é violentado pelo empregado do bar, Estha não reage apenas cumpre o que lhe é pedido pelo seu violentador. Outro aspecto comum na Índia - a Pedofilia! Estha como disse não reclama, não diz nada à mãe com medo que esta goste um pouco menos dele, tal como acontece com Rachel. A mãe - Ammu - é o mundo de ambos e todo o seu universo!
No momento em que a Família se dirige ao hotel, para passar a noite (antes da ida ao aeroporto) há mais "vermelho" para os receber. "Degraus vermelhos a subir. O mesmo tapete do átrio do cinema perseguia-os". O vermelho pode significar um aviso do que está por vir ou simplesmente para recordar a Estha o que aconteceu no cinema com o homem laranja limonada.No aeroporto, todos esperam a chegada de Margaret e Sophie Mol "de Chapéu, calças à boca de sino e Amada desde o Princípio". Novamente o "P" maiúsculo para enfatizar o amor que os outros sentem por ela.
O dia da chegada da prima, era o dia da Grande Representação. Todos tinham de estar bem na Peça, todos tinham decorado os seus papéis (actores de uma vida que não existia, mas que se fazia representar para parecer bem). A Representação, inevitavelmente, transforma-se num caos e todos retomam o seu papel de personagens secundárias ou mesmo de meros figurantes nas suas vidas.Sophie revela-se tão criança como os primos, contudo com uma pitada a mais de maldade que estes. Notamos este facto quando Rachel está a extravasar a sua tristeza matando formigas e Sophie diz-lhe "vamos deixar viver uma para ela ficar sozinha".
Tanto para esmiuçar neste livro que se torna complicado fazê-lo por escrito quando numa discussão de corpo presente seria muito mais interessante.
Há um capítulo que achei bastante importante e interessante, nomeadamente o Cap. 10, que nos mostra o quanto Estha sofre com o facto de ter sido violentado e de não ter conseguido desabafar com ninguém o que lhe sucedeu por medo. Neste capítulo, enquanto a "Peça" decorre dentro da casa, Estha mexe a compota de banana no Pickles Paraíso. Mexe, mexe, "rema" na compota e enquanto pensa a compota borbulha e as borbulhas afogam-se (tal como Estha nos seus pensamentos) e não há ninguém para ajudar nem a ele, nem às borbulhas, nem ao que irá acontecer. Mexendo a compota Estha traça um plano que marcaria todos para sempre.
Os sentimentos, nesta narrativa têm uma enorme importância, tudo gira à volta dos sentimentos dos gémeos por Ammu e pelo Deus das Pequenas Coisas e deste para com Ammu e vice-versa. No entanto, ninguém pode esquecer-se das leis do amor. Que ditavam quem devia ser amado. E como. E quanto" A meu ver as palavras "E como. E quanto" são sonoras e afirmativas. Tornando-se algo inviolável e sem perdão para quem a desrespeitar!Outro personagem muito importante nesta narrativa, mas menos explorado é Velutha, um empregado da família por quem Ammu se apaixona os dois vivem momentos proibidos de prazer e amor.
Ammu encontra a liberdade que não tem em Velutha - o Deus das Pequenas coisas - um ser inferior a ela. Ammu ama-o como mulher e os seus filhos amam-no como amigo. No entanto, Ammu não esqueceu que não era ela quem ditava quem devia amar. E como. E quanto. Mas arriscou e o Deus das Pequenas Coisas teve de morrer de forma injusta, violenta e para salvar a honra da família, os gémeos que tanto amavam aquele homem, tiveram de o culpar por algo que ele não fizera. A mágoa de o terem culpado, a mágoa da morte de Sophie Mol persegue-os até à idade em que se reencontram: 31 anos, nem novos, nem velhos, "uma idade morrível".
Rachel e Estha, Reencontram-se para se encontrarem, os gémeos passam mais uma vez a ser "nós" não ele e ela, mas "nós" um só ser. No entanto, violam as leis do amor. Que ditavam quem devia ser amado. E como. E quanto.
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Uma leitura que ADOREI!
Recomendo, no entanto com algumas reservas, pois não é uma história de leitura fácil..
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Classificação 6/7 Excelente

7 comentários:

    Também gostei muito deste livro. é sem dúvida uma narrativa fora do vulgar e cativante. A realidade da vida destas duas crianças e da sua família é comovente e por vezes chocante, e sabemos que é um retrato da Índia real, o que nos toca ainda ainda.
    O tom descritivo e infantil da narrativa chega a ser musical.
    É de facto uma obra marcante.
    Já agora, não sei que edição leste. A minha edição é a da Revista Sábado onde a personagem se chama Rahel, mas agora fiquei na dúvida.

     

    Cat SaDiablo
    Olá :)
    Pois, tens razão eu é que me enganei :P vou rectificar :)obrigado!
    É uma narrativa marcante, especialmente o fim, muito emocionante.
    Gostei especialmente das repetições para enfatizar as idéias principais, a escrita de Roy é magnífica!

     

    Ando há muito tempo para ler esse livro. Pode ser que seja em breve. Depois venho cá ler a opinião. É que agora não leio senão fico a saber a história, e gosto de ir às escuras.

     

    Aguçaste o meu apetite :)

    Agradam-me livros assim - ancorados no real.

    O título, só por si, é magistral.


    *abraço*

     

    Ando a adiar a leitura há que tempos (porque o tenho em inglês...) mas acho que desta vez vou lê-lo.
    São sempre histórias cheias de peso, de mundo atrás, de pequenas coisas, de grandes dores...
    Abraço e bom domingo!
    Venha ouvir os Beatles!
    http://falcaodejade.blogspot.com/2010/12/que-ano-horrivel-que-foi-este-e-caso.html

     

    Por engano cliquei em "eliminar" em vez de clicar em "publicar" no comentário do Iceman, peço desculpa e faço um "paste" do comentário do Iceman:

    "Eu li o livro há uns anos.
    No entanto não apreciei a escrita nem a história, porém, no fim fiquei com a sensaçao que algo me tinha escapado, ou seja, foi um dos livros que me pareceu não ter sabido tirar ou captar a essencia da história"
    Iceman do blogue http://nlivros.blogspot.com/

     

    Au Chocolat,
    Foi uma leitura que como disse no comentário adorei :)

    lupuscanissignatus,
    Olá, que bom ter-te por cá :) então tens de ler e depois deixa aqui a tua opinião do livro :)

    MJFalcão,
    Então Falcão está na hora :D vais adorar!

    Iceman,
    Eu bem que te convidei para a leitura conjunta :P assim relias :D

    Abraços a todos!

     

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